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“Dez países e também os indianos e chineses estão comprando muita
terra na Etiópia e em dez outros países africanos e criando problema lá também”
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Ilustração
mostra o avanço da soja na África motivado pelos atrativos mas também
encontrando dificuldades e não alertando para os inescapáveis impactos
ambientais sem a realização de maiores pesquisas na savana
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“O cerrado é uma das mais ricas savanas do mundo, mas não há muitos
estudos sobre as savanas da África”
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Livro Legal! Otimismo - Realidade - Esperança lançado por Luc Vankrunkelsven em Goiânia e várias outras cidades no Brasil
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Wagner Oliveira – A Europa compra muita soja do Brasil. China compra e
vai comprar muito mais. Mas Europa e China conhecem a importância e o potencial
do nosso cerrado nativo?
Luc Vankrunkelsven - É uma dinâmica histórica que não podemos parar.
Se um povo tem mais poder econômico vai comer mais carne. A Europa importa 39
milhões de toneladas de soja sendo 20 milhões de toneladas só do Brasil. Há 20
anos a maior parte da soja era importada dos Estados Unidos. A China ficou
membro da OMC em 1999 e, em 2000, começou a importação da soja que no ano 2010
chegou a 50 milhões de toneladas (previsão para 2012: 57 milhões de toneladas),
que já é muito mais do que os europeus importam. Até indianos entram agora no
paraíso do McDonald’s. Então eles conhecem o cerrado? Não! Eles não conhecem o
cerrado! Os chineses não conhecem o Brasil! Há muitos agricultores na Bélgica
que não sabem que a ração animal tem soja do Brasil. Quando falo com
brasileiros eles não sabem que a soja daqui vai para alimentar frangos e suínos
na Europa, o salmão da Norwegia que é muito barato porque come soja do Brasil e
farelo de peixe do Peru. O consumidor não sabe. Temos de conscientizar o
consumidor no Brasil e na Europa. Há um livrinho com nossa campanha: Pensar globalmente, alimentar-se localmente.
Não sou fundamentalista, pode se exportar, é bom haver comércio mas as
toneladas de soja e a dependência incrível da Europa de proteínas além-mar
nunca poderá ser sustentável.
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Documentário exibido por Luc Vankrunkelsven mostra impactos nas comunidades de grandes plantações de eucaliptos no Brasil
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Wagner Oliveira - Se não conhecem o cerrado não conhecem os problemas
ambientais brasileiros também causados muitas vezes pela monocultura de
exportação.
Luc Vankrunkelsven - Não comprenhendo
bem.... O Brasil não é o centro do mundo. É um país surgindo mas na imprensa internacional
é mais carnaval e futebol. E em terceiro lugar é Amazônia graças a ações do
Greenpeace e outras ONGS que falam só do desmatamento e do impacto mundial.
Sobre o Cerrado estão só começando a falar, poderia dizer graças ao trabalho e
aos livros de Wervel. Eu fundei há 22 anos Wervel justamente para tentar
explicar nossa responsabilidade, nosso consumo na Europa de frangos e suínos
que tem impacto até aqui. Eu escrevo e falo há 22 anos sobre este assunto. Mas
só nos últimos anos é que os Europeus estão compreendendo um pouco. Aqui muitos
de vocês agricultores não sabem que a soja é exportada para a Europa para ração
animal, não sabem que é para o biodiesel.
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Documentário exibido por Luc Vankrunkelsven
em sua palestra mostra a realidade de índios na Bahia cercados por
plantações de eucalipto e suas consequências sócio-ambientais
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Wagner Oliveira – O Senhor comenta em um capítulo do seu livro Legal! Otimismo - Realidade – Esperança que
o Brasil está de joelhos para a China. E a expansão da soja atualmente será
no norte e nordeste do Estado, regiões mais preservadas do cerrado em Goiás.
Como o senhor vê preservação ambiental e necessidade econômicas do país?
Luc Vankrunkelsven - Mas eu tenho perguntas como sobre as divisas. A
sociedade do Brasil perde muito porque tem a Lei Kandir de 1996, o agronegócio
não tem de pagar alfândega nos portos. Quem ganha com este comércio é Cargill,
Bunge, Dreyfus, ADM, e agora os chineses vão pegar essa parcela do norte de
Goiás porque esses quatro grandes não estão lá e eles querem evitar o poder
econômico e monopólio desses quatros. Os chineses vão fazer logística eles
mesmos. Mas se o norte do Estado de Goiás é uma região até agora bem conservada
podendo ter até 70% de preservação, com os chineses os índices vão diminuir.
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Florestas plantadas = vegetação nativa?
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“Os brasileiros têm muita terra, muita água. A política acha que têm a
'vocação para alimentar o mundo'. Não só o estômago das pessoas, mas também o
‘estômago’ dos carros: biodiesel da soja, etanol da cana-de-açúcar. E vocês
sabem quem vai ganhar – o ‘estômago’ do carro porque tem mais poder”
Wagner Oliveira – No ano passado o senhor já observava que artigos
sobre o Cerrado estavam surgindo na Europa e outros continentes. Assim a
discussão ficou internacional. O que avançou do ano passado para este ano?
Luc Vankrunkelsven - É lentamente. É novo. Graças a ações do
Greempeace e outras organizações a Amazônia é bem conhecida e as pessoas não
gostam de desmatamento. Mas ninguém conhecia o cerrado. Agora está começando.
Há organizações como Friends of the Earth
Europe - Amigos da Terra (www.foe.co.uk/) - que incorporaram a importância
do Cerrado. É um emblema de muitos organizações de meio ambiente para a Europa
inteira. Em análises e textos para a imprensa eles falam sobre a soja e o
problema da Amazônia e o Cerrado. Não só a Amazônia. Essa é a mudança do último
ano. Acho que é resultado de um sinergia. Wervel e Friend of the Earth Europe têm escritório no conjunto de Mundo B (www.mundo-b.org; 40 organizações com 400 operários da
Europa inteira, perto do Parlamento Européio em Bruxelas). Tentamos também
trabalhar junto com o Parlamento Europeu sobre o Código Florestal fazendo um
alerta, como uma voz de Bruxelas para o Brasil sobre o perigo do novo Código
Florestal Brasileiro. Mas não foi possível, mesmo com muito trabalho.
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| Documentários exibidos por Luc Vankrunkelsven em suas palestras em Goiânia |
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“Em Israel guerra entre palestinos e israelenses é sobre fontes de
água também”
Wagner Oliveira – Há quem diz que a soja vai continuar sendo a
locomotiva do agronegócio em 2013. O Mato Grosso tem este ano a produção record
de soja e pode chegar a 24 milhões de toneladas em 2013. Como o senhor vê esses
números?
Luc Vankrunkelsven - Vai também aumentar em Rondônia, em Goiás com os
chineses e outros. Um dos elementos do meu pessimismo é que não posso mudar e
você também não pode quando um povo tem mais poder econômico. Agora os
asiáticos, primeiramente os chineses e até os indianos vão comer mais carne. E
quando um povo tem 1% a mais de poder econômico normalmente vai comer 0,5% a
mais de carne e para isso precisa de muita terra e muita água daqui (Brasil). China
tem 20 % da população do mundo, mas só tem 6% da terra arável do mundo e 6% da
água doce do mundo. Eles buscam e ocupam terra no Brasil, na África... Em 15
anos há mais indianos que chineses... Eles vão buscar também: terra e água. As tendências
mundiais são que o consumo de boi vai diminuir um pouco. Mas o consumo de
frango e suíno, sobretudo de frango, vai subir muito e eles comem soja e milho.
Então não vamos parar.
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Colheita
de grãos na África começa sem antes o desenvolvimento de pesquisas
sobre o potencial da savana africana como ocorreu com o cerrado
brasileiro há pouco mais de três décadas
Wagner Oliveira – Nova soja transgênica da Monsanto chamada BTRR2 deve
chegar primeiro ao Brasil em 2013. O total de transgênicos deve subir para ¾ da
soja plantada na safra de 2010/2011. Como o senhor vê a expansão da soja
transgênica no Brasil?
Luc Vankrunkelsven - A Monsanto joga bem o jogo. Eles usaram os
agricultores. Primeiro trouxeram a soja transgênica nos anos 90 da Argentina e
cultivaram ilegalmente no Rio Grande do Sul e o presidente Lula fez a
legalização em 2004. Agora é preciso pagar royalties e vai se espalhar mais
ainda. Em Rondônia só 5% da soja é transgênica. No Mato Grosso também não é
muito, em outros Estados pode ser mais. Por exemplo no Rio Grande do Sul é 95%.
Vai crescer no mundo e também no Brasil. O milho transgênico também está sendo
utilizado em experiências na Bélgica. É novo para nós, não para cultivo mas
para experiências. Tem também uma grande discussão na Bélgica, na Europa porque
80% dos europeus não gostam também dos transgênicos. É uma discussão não só
daqui do Brasil mas de lá também.
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“Não sou contra o comércio, não sou contra a economia. Não precisamos
ser pobres. Mas podemos gerar mais riquezas por exemplo com agrofloresta que
com monocultura da soja”
Wagner Oliveira – Muitos países da Europa estão passando por crises,
com dívidas. A Europa hoje pode pensar em auto-suficiência em relação a
produção de alimentos?
Luc Vankrunkelsven - É um dos meus temas. Neste ano faz 50 anos que
começou em 1962 a política comum de agricultura da Europa. Naquele ano começou
o fluxo de proteínas de soja dos Estados Unidos. Dos anos 1970 a 1980,
sobretudo de 1990 a 2000, e até agora do Brasil. É possível se pararmos, se
diminuirmos esse fluxo de proteínas, se pararmos de exportar o trigo (30
milhões de toneladas por ano) temos de ser autônomos na nossa produção. Mas a
Europa pensa que tem 'vocação para exportar'. Devemos parar com essas
exportações. O Brasil também tem a visão de que tem de alimentar o mundo. Mas
isso é muito difícil, só possível com muita energia, muita proteína de fora. É
o oposto da ideia de 'soberania alimentar'
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| Luc na TBC em Goiânia em programa de entrevistas |
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“A Bélgica é muito pequena, mas é o sexto país exportador de produtos
alimentícios. A exportação de frangos e suínos só é possível com a importação
de soja do Brasil, Argentina e de outros países”
Wagner Oliveira – Alternativas como a substituição da soja por
tremoço, colza, gramíneas-trevo, cânhamo na Europa estão dando certo?
Luc Vankrunkelsven - Sim, está crescendo. Até a França também começou
a plantar soja novamente desde 2010. Só é possível quando o governo dá um pouco
de subsídio porque a soja chega muito barata do Brasil porque não paga nada de
alfândega com a Lei Kandir e nada na entrada dos portos na Europa. Soja do
Brasil é mais barata por exemplo em relação a soja da Argentina que quando sai
do porto tem de pagar alfândega. Então é impossível plantar nossas proteínas na
Europa porque é sempre mais caro. Os governos têm de ajudar os agricultores. Outro
exemplo. O governo da Flandres, região norte da Bélgica, implementou em
2011 uma proposta da Comissão Europeia,
a Agrofloresta. Quando um agricultor vai plantar árvores no sistema
agrofloresta ganha 70% do custo do plantio. Tremoço é mais no sul da Europa mas
está começando também em outras regiões. É possível plantar até Hamburgo.
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“Há cinco anos fiz palestras para grupos de dez, quinze pessoas nas
universidades de Goiânia; agora 200 pessoas”
Wagner Oliveira – No Capítulo 29 o senhor aborda Brasil grande
exportador de água. Um contraste já que a água é cada vez mais um líquido
precioso. Em Goiás já temos conflitos pela água no município de Cristalina onde
há o maior número de pivôs no Estado. Como o senhor vê o Brasil como grande
exportador de água?
Luc Vankrunkelsven -
O Brasil tem tudo: terra, minerais, água. E água é muito importante no mundo. Poderia
dizer que o Brasil exporta muito barata sua água para Europa, China e Japão em
forma de soja, etanol, carne, etc. Há quem diz que guerras do século XXI serão
por água. Em Israel guerra entre palestinos e israelenses é sobre fontes de
água também. Mas também no Brasil a desertificação está avançando.
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“Como vocês têm aqui agricultores sem-terra, nós temos muitos frangos
e suínos sem-terra. A terra e a água estão aqui. Tudo é importado. Esse sistema
internacional precisa de muita energia e não tem futuro”
Wagner Oliveira – No capítulo 35 o senhor aborda a história da soja, a
história de sucesso fazendo uma interrogação: “Oficialmente o agronegócio é uma
história de sucesso, contudo apesar de toda a propaganda muitos fazendeiros do
Mato Grosso incorrem em dívidas equivalentes entre três e dez vezes seus
patrimônios. Ou seja, uma bolha financeira que pode explodir a qualquer
momento”. Gostaria que o senhor comentasse sobre essa bolha financeira que pode
explodir a qualquer momento.
Luc Vankrunkelsven - Não tenho mais dados. Esses dados são de um
doutorado de uma pessoa do Rio Grande do Sul que mora no Mato Grosso. Ele
conversou com fazendeiros individualmente e eles disseram mas nunca vão dizer
publicamente. Esses fazendeiros têm problemas de dívidas como está escrito no
meu livro.
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Na Universidade Federal de Goiás logo após palestra
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| Luc Vankrunkelsven recebido por Mizair Lemes (de cinza) na Agência Municipal de Meio Ambiente AMMA em Goiânia onde ele realizou palestra |
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Wagner Oliveira - A Monsanto espera lançar a primeira cana transgênica
resistente a herbicidas e tolerante a insetos em 2020, portanto daqui a oito
anos. Como o senhor vê a tecnologia dos transgênicos, depois da soja chegando a
cana-de-açúcar, cana do etanol?
Luc Vankrunkelsven - Ciência transgênica é só um elemento do sistema
não sustentável. Acho que o problema maior é a monocultura exportadora.
Transgênico é um problema grave de concentração de poder. É um triângulo
perverso, a indústria química comprou nos últimos 20 anos as sementes e comprou
o know-how, como manipular essas
sementes, por exemplo, a soja da Monsanto manipulada para a Roundup da mesma
Monsanto. Esse triângulo de lucro sementes-chemeia-transgenia
é perverso.
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Notícias na imprensa:
Países compram terra no exterior
África
é a preferida e a motivação vem do aumento nos preços das commodities agrícolas
e escassez de recursos naturais
China comprou mais de 5 milhões de hectares em
outros países e principalmente na África Central e no sudeste asiático
O Estados Unidos comprou mais de 4 milhões de
hectares no sudeste asiático, America Latina e principalmente na África.
Países mais procurados: Indonésia, Malásia, Filipinas
, Etiópia, Congo , Sudão e o Brasil, que vendeu cerca de 4 milhões de hectares em
pouco mais de 10 anos. (Com informações da revista Exame.com de 15-05-2012)
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Brasileiros plantam soja e algodão na África
Brasileiros foram atraídos para a África pelo
baixo custo de produção e menor distância com mercados da Europa, Ásia e
Oriente Médio.
Governos oferecem isenção tributária e boas condições de
financiamento. “A savana africana é tida como "o novo cerrado" para a
FAO (braço das Nações Unidas para a agricultura e a alimentação).
Segundo a
organização, a região pode se tornar um centro mundial de produção de grãos e
alimentos, já que apenas 10% de sua área agricultável é utilizada.” (Com informações da Folha de São Paulo
17-06-2010)
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Frete para a China ficará mais barato
Moçambique
colocou à disposição do Brasil 6 milhões de hectares em quatro estados
do norte do país, para explorá-las em regime de concessão por 50 anos
pagando imposto de R$ 21 ao ano por hectare.
O governo
exige apenas que pelo menos 90% da mão-de-obra seja local. O país
africano também concede isenção de impostos para a importação de
máquinas e equipamentos agrícolas.
Terras de Moçambique
são semelhantes às do cerrado brasileiro, licenças ambientais são mais
fáceis de serem obtidas e o custo do frete para a China ficará mais
barato. (Com informações da Folha de São Paulo de 14-08-2011)
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